terça-feira, 17 de maio de 2011

Não custa se doar outra vez na vida...

Eram 18h30, era sexta-feira.
Estela estava em seu quarto, parada em frente ao guarda roupa desde as 18h, pensando. Não, ela não estava indecisa com a roupa que iria usar naquela noite, mas sim, estava surpresa com o fato de se importar em estar bem arrumada pra alguém pela primeira vez em sua vida.
Estela, sempre se vestiu pra ela e pra mais ninguém, sem se importar com o que iriam dizer, sem se importar se era frio demais ou calor demais, e muito menos se aquele seu jeans estava fora de moda ou não. Era ela quem ditava as regras de seu próprio jogo.
Mas, pela primeira vez na vida, Estela se encontrava dividida entre suas regras e as regras de outro alguém. Eduardo.
Aliás, já havia um certo tempo que Estela já não pensava mais nela, havia mais alguém no centro do seu mundo, outras regras estavam entrando no seu jogo.Estela negava isso pra todo mundo, e ás vezes até pra ela mesma, mas existiam momentos em que ela não conseguia e nem podia fugir disso, momentos desolidão com ela mesma, mas, na maioria das vezes, momentos em que seus olhos se encontravam com os de Eduardo, aí ela se despia de suas máscaras.
Ainda parada em frente ao guarda-roupa, Estela descarta a intenção de usar seu bom e velho jeans. "Não custa se doar uma vez na vida" - pensou ela , mas como o tempo estava frio, teve que optar por um outro jeans, mas dessa vez não um escuro, velho e sim um claro, semi novo, que ganhou de sua mãe e que usou uma vez.
Encontrou o jeans, a blusinha e o casaco preferido. Tomou seu banho, se vestiu, se perfumou e soltou os cabelos. "Edu gosta quando eles estão soltos" - olhou no espelho e sorriu.
19h30. Faltavam trinta minutos pra que Eduardo chegasse. Estela vai até a sala, liga a tv e se acomoda no sofá. Sorri aliviada, seus pais não estão em casa e muito menos seu irmão chato, que a impedia sempre de sair nos finais de semana. A tv estava ligada, mas o que Estela assistia era um filme que passava em sua mente. Sozinha ela se recordava das coisas como eram antes e via em como elas são hoje. Sozinha lembrou dos seus amores, dos seus princípios, das suas dores e da sua cicatriz  que há muito tempo a impedia de se doar de verdade a alguém. E assim ela queria seguir, assim ela tinha que seguir. Sem voar, sem tirar os pés do chão, pra não cair. Se houvesse alguma doação, seria doação pela metade e nunca por completo, doação somente por prazer e nunca por amor, nunca por um sentimento maior, nunca por ela, num todo.
20h e alguém toca a campainha lá fora. Edu!
Estela desliga a tv, apaga as luzes e fecha a casa. Vai saindo pra fora e um sorriso aparece em seus lábios sem que ela nem tivesse chegado ao portão. Ela chega, sai pra fora e Edu  está dentro do carro. Ele nunca fez as "honrrarias" de abrir a porta do carro, sabia que Estela não gostava de coisas assim, mas naquela noite, de dentro do carro ele abriu a porta, Estela revirou os olhos, mas sorriu sem se incomodar.
Dali foram ao cinema, conversaram, trocaram uns beijos, nada muito diferente pra Estela, que já havia atuado várias vezes em cena como essa na sua vida. Apenas uma diferença ela sentia: Não queria que aquela noite terminasse.
"Não é desmerecer os outros" - pensou ela enquanto via as imagens do filme. Estela raramente se apegava. Filtrava seus sentimentos da melhor forma possível, pra algumas pessoas ela era fria, calculista ... a tarja de sexo frágil nunca foi imposta a ela por ninguém. Quando estava com alguém, estava, curtia, mas era apenas isso, aquele momento e só. Amanhã é era outro dia, amanhã ela seria outra pessoa.
O filme acabou, Estela nem sabia ao certo do que se tratava a história que ela tinha acabado de "assistir", mas uma coisa ela tinha certeza: a noite não podia acabar ali.
Saíram os dois juntos do cinema, Estela e Eduardo. O frio impedia que fossem pra um lugar aberto, como por exemplo o bar preferido da Estela, logo então surgiu a idéia: "Vamos em casa" - disse Estela, sem pensar.
Entraram no carro, ligaram o rádio e quem os visse ali, cantando e rindo sobre o filme que eles mal prestaram atenção, diria que seriam bons e velhos amigos, nunca, namorados. Talvez fosse essa "estética" que atraísse Estela pra esse relacionamento. Ou, não. Talvez fosse Eduardo.
O carro encostou na calçada, e sem delongas os dois desceram do carro e ja entraram na casa, o frio era congelante. Estela não se preocupou em abrir as janelas, e não se preocupou nem um minuto em agradar Eduardo com "cortesias" da casa. Se preocupou somente em ser ela, em se deixar presente ali e nada mais,apenas manteu as luzes apagadas e acendeu o abajur na sala.
Eduardo a conhecia, sabia dos seus jeitos, não esperava muita coisa, o que tivesse dela já estava bom. Bom até demais pra uma menina que quase nunca se entrega de verdade.
Sentaram os dois no sofá, conversaram mais sobre ele do que sobre ela, não demorou muito pra que os carinhos surgissem, que as bocas se encontrassem e que os corpos juntos se aquecessem.
Nada diferente pra Estela, por enquanto. Já tinha passado por isso várias vezes, e sem receio nenhum ela teria medo de ousar, pedir pra parar, acabar com o clima e mandar Eduardo pra casa. Ela pensou em fazer isso, apenas pensou.
Eduardo a envolvia de uma certa maneira, que seu corpo era incapaz de fugir. Na sua cabeça, memórias de um passado doloroso vieram a mente, Estela se viu chorando pela ultima pessoa a qual havia se entregado e isso e encorajava muito mais a sair dali e acabar com tudo. Pena que toda essa coragem acabava quando os olhos de Eduardo encontravam com os seus.
Eduardo olha em seus olhos com uma ternura que Estela nunca tinha visto em nenhum outro lugar, sorri e acaricia seu rosto como se aquele amasso pra ele tivesse valido a noite. No fundo dos olhos de Eduardo, Estela encherga um brilho que nunca enxergou nos olhos de nenhum outro, um brilho que puxava a Estela que estava presa por tanto tempo dentro dela mesma.
"Vou entender se você não quiser" -  disse Eduardo sem parar de sorrir
Estela calou-se, e nesse momento apenas sua mente ousou dizer alguma coisa. Ela podia muito bem sorrir e acabar com aquilo tudo, podia continuar estendendo seu passado dentro de si mesma e sendo a mesma Estela fria e calculista, que se doa por prazer e nunca por um sentimento maior. Nesse momento, Estela se lembrou do seu bom e velho e inseparável jeans. Pensou com ela "quem é essa pessoa que me fez abrir mão de quem eu realmente sou? Quem é o dono desses olhos convincentes que me fizeram desapegar do meu jeans desbotado e escuro?"
Estela? Você ouviu? Eu disse que vou entender se você não quiser... - Estela desperta de seus pensamentos e interrompe Eduardo colocando o dedo na sua boca, em sinal de silêncio e apenas diz: "Não custa se doar outra vez na vida" - sorri ao ver o sorriso e a face desentendia de Eduardo, tira seu casaco, sua blusinha, sorri outra vez e apaga o abajur da sala ...

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